quinta-feira, 25 de junho de 2015

[RELATO 1] - O Dragão - Kheldrim, o Lobo Selvagem

“...eu estava psicologicamente abalado. Afinal, eram vários os motivos que me faziam titubear. A cada flecha que errava, eu desconfiava ainda mais de mim mesmo. Minha concentração, minha calma, minha alma não eram as mesmas. Estava em uma missão com humanos, raça a qual eu desprezava. Todo o meu treinamento e experiência não eram suficientes para entender o que acontecia ali naquela caverna, e me sentia inferior, inútil. Me pegava pensando a todo momento qual era o motivo de estar ali, por que eu havia aceitado e me sujeitado a isso? Estava em uma área que, embora meus conhecimentos de masmorra a tornasse ‘familiar’, não me deixava a vontade. Pensava a todo momento na floresta, podia sentir as estrelas, o calor do sol. Imaginava a infinidade do céu e minha afinidade com a floresta. A história seria diferente. Na verdade, eram esses pensamentos, da floresta, que me davam forças para continuar. Não, a quem estou enganando? Esses pensamentos apenas me ajudavam a retomar a concentração. O que me dava forças para continuar, sem dúvida, era a adrenalina causada por toda aquela situação. Era a confusão da batalha, os gritos, o sangue escorrendo pelo meu corpo e, principalmente, o prazer que sentia ao ver o último sinal de vida se esvair das criaturas vítimas das minhas flechas. Eu amava aquilo.
Após um breve confronto com Hobgoblins, caminhávamos em torno do grande lago, fazendo o caminho de volta para a saída da caverna, para nos recuperar e poder voltar com força total e enfrentar o temido Verme da Carniça. Eu estava olhando para cima, para o grande buraco no teto do local, onde os espíritos haviam indicado que descansava um Dragão. A ideia de que aquele lugar era o habitat de um Dragão me gelava a espinha. Embora nunca tivesse visto um, os contos dos bardos e as histórias sobre tais criaturas eram assustadoras. Diante desse turbilhão de pensamentos, senti um impacto muito leve na ponta da minha bota direita e, em seguida, um barulho de algo caindo nas águas calmas do lago. Eu havia, num momento de distração, chutado uma pedra. Segundos tensos se passaram, todos pararam e eu pensei ‘o que está acontecendo comigo?’, meu pensamento de autocondenação foi interrompido pelo anão, que sussurrou para continuarmos andando, com calma, sem barulho. Assim o fizemos. Entretanto, poucos passos depois, todos pararam abruptamente e forçaram os ouvidos para perceber que havia sons vindos diretamente do buraco do Dragão. Continuamos mais uns passos e os sons não pararam, pelo contrário, aumentaram. Eram passos, com certeza, de alguma criatura. ‘O Dragão existe e está vindo!’ pensei comigo. Nesse momento, não hesitei e comecei a correr após um rápido aviso aos outros ‘corram!’. Eu sabia, embora não gostasse nem um pouco da ideia, que não tínhamos chances contra uma criatura daquelas e nossa melhor opção se quiséssemos continuar vivos era fugir. Sinceramente, não me lembro muito bem do que aconteceu depois disso. Acredito que a adrenalina e o medo se misturaram e formaram uma espécie de substância capaz de apagar fragmentos de memória, pois, lembro de alguns momentos apenas. Lembro que os sons dos passos atrás de mim eram altíssimos e que, quando alcancei o outro salão, fui surpreendido pelo Verme da Carniça, que também foi surpreendido pela nossa presença repentina. Como eu estava à frente de todos, consegui facilmente desviar dele com um salto para o lado. Minha visão não era muito boa, pois, o mago estava com a lanterna correndo atrás de mim e o foco de luz produzido pelo equipamento balançava de cima para baixo e, as vezes, para os lados. Quando eu estava fazendo a curva, saindo do salão, olhei para trás, por cima dos ombros e, no meio daquela confusão de luzes e aberrações, pude perceber que o sacerdote estava imóvel, com o Verme grudado no seu corpo. Naquele mesmo instante, por instinto, eu travei os pés, fazendo com que eu derrapasse e parasse. ‘O que estou fazendo? Há um dragão atrás de nós e ele foi atingido pelo Verme da Carniça, não posso voltar. Além disso, ele vai servir de distração para os monstros e dessa forma teremos uma chance para fugir daqui. Ele é humano!’ após esses milésimos de segundos que duraram entre a freada brusca e o pensamento, continuei correndo. Mas, algo estava errado, sentia que devia voltar. O sacerdote não havia pensado duas vezes ao se jogar na água para me salvar da serpente, o que eu estava fazendo deixando-o para a morte? ‘Não, não está certo’ derrapei novamente e impulsionei meu corpo, desequilibrado, para trás. Ao chegar no mago peguei-o pelo braço e gritei ‘Edwin, venha comigo!’. Logo passamos pelo anão que, visivelmente assustado, ao meu ver, voltou conosco.

Assim que terminamos de seguir pela curva do corredor e chegamos à entrada do salão, vi um grande Dragão atacando o Verme com sua cauda e, em seguida abocanhando-o. Assim que o Verme foi puxado para cima, o sacerdote caiu no chão, duro. Meu instinto me fez correr em direção a ele, sabendo que poderia ser uma corrida para a morte. Quando estava quase chegando no corpo estirado do sacerdote, o Dragão rasgou o Verme em dois com suas patas e sua boca, despejando uma gosma branca fétida ao seu redor. Logo em seguida olhou-me e vociferou em minha direção, fazendo-me cair no mesmo momento, com as costas no chão. Não conseguia pensar em nada, meus olhos estavam fixos no grande animal. Sentia minha espinha gelada. Meu corpo arrepiava de cima a baixo, não respondia. O medo era tanto que não percebi o Dragão indo embora, com um pedaço da sua presa na boca e só retomei o controle do meu corpo quando Edwin me chacoalhou pelos ombros. Pegamos o sacerdote e saímos, rapidamente, daquela caverna. Nunca senti tanto medo na vida como naquele momento.”

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